Agentes e Processos de Interferência, Risco, Impacto e Dano Ambiental: Sistemas Terrestres
DOI: https://doi.org/10.12957/ric.2023.72623
Dr. J.R. de Almeida
[https://x.com/dralmeidajr][in
Editora Priscila M. S. Gomes
A Terra sob nossos
pés: o solo está tentando nos dizer algo
Ao longo da minha jornada como pesquisadora, descobri que o solo, muitas vezes esquecido sob nossos pés, é um verdadeiro livro aberto sobre a saúde do nosso planeta. E como qualquer organismo vivo, ele reage e sofre com os impactos naturais e, principalmente, com a ação humana. Foi essa percepção que me levou a mergulhar numa investigação sobre os principais agentes que vêm modificando as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo em diversos ecossistemas ao redor do mundo.
Durante essa análise, ficou
claro: mudanças no regime de chuvas, alterações químicas e nutricionais, além
da redução do volume disponível de solo, têm contribuído diretamente para a
expansão de áreas semiáridas. Essa transformação não é invisível. Ela se
materializa em regiões que antes eram férteis e agora se tornam improdutivas,
vulneráveis e até hostis à vida.
Ao observar os taludes aquelas encostas naturais formadas por solo e rocha percebi que os movimentos de massa, como deslizamentos e quedas, são mais comuns do que imaginamos. Eles ocorrem naturalmente, é verdade, mas tornam-se frequentes e perigosos quando interferimos, escavando, construindo ou desviando cursos d’água. Situações corriqueiras, como a abertura de uma estrada ou a prática agrícola em terrenos inclinados, podem desencadear desastres.
Outro alerta vem da
subsidência, um fenômeno que parece silencioso, mas é profundamente revelador.
Em áreas como os Everglades, nos EUA, ou os polders holandeses, a drenagem e o
uso excessivo do solo para agricultura levaram ao afundamento do terreno. A retirada
de água ou minerais do subsolo provoca o colapso de estruturas naturais, e o
solo, que antes sustentava plantações e florestas, simplesmente cede.
E o que dizer da forma como
alteramos os ciclos naturais de nutrientes? Interferimos constantemente na
dinâmica do nitrogênio, fósforo, potássio e outros elementos fundamentais. A
introdução de fertilizantes artificiais, o escoamento de água contaminada e a
colheita intensiva desequilibram um sistema que, quando em harmonia, é
autossuficiente e produtivo.
Em desertos, por exemplo, mesmo com uma concentração alta de nutrientes, a falta de água e a baixa transferência entre os compartimentos do ecossistema impedem a reciclagem adequada. Já nas tundras, o solo pobre e o frio extremo dificultam qualquer tentativa de recuperação ambiental. Nestes casos, tentar “melhorar” a produtividade com métodos convencionais é como tentar cultivar flores no gelo.
A erosão do solo também me
chamou atenção. Mudanças no clima, na cobertura vegetal ou no uso do solo
impactam diretamente sua capacidade de regeneração. A paisagem se transforma, e
o solo, quando exposto sem proteção, torna-se vulnerável, perdendo nutrientes e
sua capacidade produtiva.
O que mais me impressionou foi
compreender o impacto silencioso da salinização. Com a irrigação prolongada,
especialmente em regiões áridas, o nível de água subterrânea sobe. Quando
evapora, o sal fica. E, pouco a pouco, esse sal se acumula na superfície,
transformando áreas férteis em desertos improdutivos. Em alguns casos, o
processo é irreversível.
Apesar de existirem sistemas de irrigação sustentáveis que funcionam há séculos, a verdade é que grande parte das terras irrigadas atualmente já apresenta sinais de salinização. Estima-se que entre 20% e 40% dessas áreas estejam sendo perdidas. Não é exagero afirmar que a salinização do solo contribuiu para o colapso de civilizações inteiras que dependeram da agricultura em regiões semiáridas.
Ao final desta jornada, fiquei
com a sensação de que o solo está nos dando sinais claros de esgotamento. É
preciso ouvi-lo. Se quisermos preservar a base da nossa cadeia alimentar,
proteger os solos deve ser uma prioridade não só para cientistas, mas para
todos nós.
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